Bitcoin perde espaço para stablecoins, diz Cathie Wood

O Bitcoin está a perder terreno onde deveria triunfar? Cathie Wood, CEO da ARK Invest e uma das principais figuras do investimento em cripto, acaba de reduzir a sua meta mais ambiciosa para o BTC. O motivo é a ascensão das stablecoins nas economias emergentes, onde estão a estabelecer-se como uma nova reserva de valor. Um forte ajuste estratégico que questiona o verdadeiro papel que o Bitcoin irá desempenhar face a estas alternativas lastreadas em dólar.

Cathie Wood revê o seu cenário otimista para o Bitcoin devido à ascensão das stablecoins

Numa entrevista à CNBC a 7 de novembro, Cathie Wood, fundadora e CEO da ARK Invest, anunciou uma revisão significativa do seu cenário mais ambicioso para o Bitcoin.

A sua nova projeção: $1,2 milhões até 2030, abaixo dos $1,5 milhões anteriormente previstos. Este ajuste de $300.000 é explicado por um desenvolvimento que ela considera estrutural: “as stablecoins estão a assumir parte do papel que inicialmente pensávamos estar reservado ao Bitcoin”, explicou, referindo-se à sua adoção massiva nas economias emergentes, nomeadamente como reserva de valor.

Wood acredita que as stablecoins estão a ganhar terreno inesperado em contextos geopolíticos onde o Bitcoin poderia ter prevalecido. Ela mantém-se convicta do valor fundamental do BTC, chamando-lhe um “sistema monetário global” com características próximas do ouro, mas admite que algumas funções outrora consideradas exclusivas do Bitcoin são agora partilhadas. Para melhor compreender as razões desta revisão, eis os pontos-chave levantados pela investidora:

• Um cenário otimista revisto: a ARK Invest reduz a sua meta de longo prazo para o BTC de $1,5M para $1,2M até 2030;

• A principal causa identificada: a ascensão rápida das stablecoins, especialmente nos mercados emergentes;

• Uma distinção clara: para Wood, o BTC continua a ser um ativo fundamentalmente diferente, uma forma de “ouro digital”, enquanto as stablecoins são “simplesmente dinheiro fiduciário tokenizado numa blockchain”.

Esta declaração marca uma mudança significativa de tom, mantendo uma visão globalmente positiva sobre o Bitcoin. Destaca sobretudo um realinhamento estratégico. O Bitcoin mantém o seu papel sistémico a nível mundial, mas as expectativas quanto à sua adoção em certos usos, nomeadamente em economias sob pressão, são agora moderadas a favor das stablecoins.

A ascensão das stablecoins baralha as cartas nos mercados emergentes

A revisão do cenário de Cathie Wood baseia-se em tendências económicas observadas em várias regiões do mundo, especialmente na América Latina. O uso massivo de stablecoins em economias que enfrentam hiperinflação, controlos de capitais ou sanções internacionais já não é marginal.

É agora um fenómeno estrutural. O caso da Venezuela é emblemático. Segundo dados do FMI, a inflação anual do bolívar é de 269% este ano, levando as pessoas a recorrer a ativos mais estáveis para preservar o seu poder de compra. Neste contexto, stablecoins lastreadas em dólar, como o USDT da Tether, afirmaram-se como ferramentas de sobrevivência financeira.

Para além do uso doméstico, o seu papel estende-se agora a aplicações estatais. Em 2024, vários relatórios revelaram que o governo venezuelano utilizou stablecoins para contornar as sanções dos EUA e continuar as suas exportações internacionais de petróleo.

Esta realidade apoia a análise do Standard Chartered de que as stablecoins poderão desviar até $1.000 mil milhões dos sistemas bancários tradicionais nos países emergentes até 2028. A ascensão das stablecoins, facilitada pela sua acessibilidade tecnológica e ancoragem numa moeda forte, redesenha assim os equilíbrios monetários onde as moedas nacionais estão em crise.

A competição implícita entre Bitcoin e stablecoins nos usos fundamentais do dinheiro — reserva de valor, meio de troca, unidade de conta — mas também a capacidade dos reguladores de supervisionar um fenómeno em parte fora da sua jurisdição. Enquanto Cathie Wood continua a acreditar no potencial transformador do Bitcoin, a sua análise atualizada reflete clareza estratégica. O futuro será plural, partilhado entre diferentes soluções cripto que respondem a necessidades específicas. O crescimento das stablecoins, longe de ser um mero epifenómeno, poderá muito bem representar um reequilíbrio duradouro na economia digital global.